Governo
do Estado do Rio de Janeiro
Secretaria de Estado de Educação
Foco: 2015; o
Ano Internacional da Luz e das Tecnologias baseadas na Luz
Texto emotizador: O incêndio de cada um (Afonso Romano de Sant’anna)
A cena foi simples. Lá ia eu passando de carro pela
Lagoa quando vi na calçada uma moça esperando o ônibus com seu jeans e bolsa a
tiracolo. Nada demais numa moça esperando o ônibus. Mas eis que passou um
caminhão de som tocando uma lambada. Aí aconteceu. Aconteceu uma coisa quase
imperceptível, mas aconteceu: os quadris da moça começaram a se mexer num ritmo
aliciante. Já não era a mesma criatura antes estática, solitária, esperando o
ônibus na calçada. Ela havia se coberto de graça, algo nela se incendiara.
A fotógrafa veio fazer umas fotos. Estava com o
pescoço envolto num pano, pois tinha torcicolo. E eu ali posando meio frio,
fingindo naturalidade, e ela cautelosa com seu pescoço meio duro, tirando uma
foto aqui, outra ali, quase burocraticamente. De repente ela descobriu um
ângulo, e pronto: se incendiou profissionalmente, jogou-se no chão, clic daqui,
clic dali... Desabrochou o pescoço já não doía. Ela havia detonado em si o que
mais profundamente ela era.
Estamos numa festa. Aquele bate papo no meio
daquelas comidinhas e bebidinhas. Mas de repente alguém insiste para que outro
toque violão. Aparentemente a contragosto ele pega o instrumento. E começa a
dedilhar. Pronto, virou outra pessoa. Manifestou-se. Elevou-se acima dos
demais, está além da banalidade de cada um. Achou o seu lugar em si mesmo.
Assim também ocorre quando vemos no palco o cantor
dar seus agudos invejáveis, o bailarino dar seus saltos ou o atleta no campo
disparar seus músculos e fazer aquilo que só ele pode fazer melhor que todos
nós... Isto é o que se dá até quando um conferencista ou um professor entreabre
seu discurso e põe-se como uma sereia a seduzir a plateia, como um maestro
seduz todo o teatro. Há um momento de sedução típico de cada um. Quando o
indivíduo está assentado no que lhe é mais próprio e natural. Isto encanta.
Claro, esses são exemplos até esperados. Mas há
outros modos de o corpo de uma pessoa embandeirar-se como se tivesse achado o
seu jeito único e melhor de ser. Digo o corpo e a alma.
Mas nem todos podem ser tão espetaculares. Nem por
isso o pequeno acontecimento é menos comovente.
De que estou falando? De algo simples e igualmente
comovente. Por exemplo-o jardineiro que ao ser jardineiro é jardineiro como só
o jardineiro sabe e pode ser. E que ao falar das flores, ao exibi-las cercadas
de palavras, percebe-se, ele está em transe...Feita com amor, até uma coleção
de selos se magnifica. Se torna mais imponente que uma pirâmide se a pirâmide
for descrita ou feita por quem não a ama. É assim que pode entrar pela sala
alguém e servir um cafezinho, mas sendo aquele o cafezinho onde ela põe sua
alma, ela se torna de uma luminosidade invejável.
Cada um tem um momento, um gesto, um ato em que se
individualiza e brilha. Nisto nos parecemos com os animais e peixes ou quem
sabe com as nuvens. Animais e peixes têm isto: têm trejeitos raros e sedutores,
cada um segundo sua espécie. Até as nuvens, como eu dizia, têm seu momento de
glória.
Uma vez vi um pintor em plena ação, pintando. Meu
deus! O homem era um incêndio só, uma alucinação. Sua respiração disparou, ele
praticamente bufava, parecia mais um cavalo de corrida, indômito, indócil. E
sua face vibrava, havia uma febre nos seus gestos. Era uma erupção cromática,
um assomo de formas e volumes.
Então é disso que estou falando. Dessa coisa
simples e única, quando o que cada um tem mais seu relampeja a olhos vistos.
Quando isto se dá, quebra-se a monotonia e o indivíduo se transcendentaliza.
Reluzentemente
Lucia de
J. Duarte
A
Equipe Diretiva do C. E. Jose Marti
Colégio Estadual Jose Marti
Avenida Professor Plínio Bastos, nº 631, Olaria- RJ
Telefone: 23347528
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